Fazer mais com menos: uma receita para tempos bicudos
Enxugar as despesas rotineiras nos mínimos detalhes pode ser uma estratégia eficaz para se equilibrar nesta fase de turbulência econômica
Em momentos de retração econômica, garantir um faturamento estável torna-se ainda mais difícil. Para gerar valor ao negócio, a saída do empreendedor é recorrer a práticas para aumentar a eficiência.
“Uma das opções é criar um programa de redução de custo”, afirma Matthew Govier, diretor executivo da Accenture Strategy, que recentemente recebeu a equipe do DC na sede da consultoria em São Paulo.
Entre 2014 e 2015, a demanda por gestão de custo aumentou cerca de cinco vezes na consultoria. “As empresas estão buscando programas de Orçamento Base Zero (OBZ) para aumentar a rentabilidade”, afirma o especialista.
No modelo OBZ, a redução de despesas é apoiada pela disseminação das melhores práticas de contenção de custo entre as diferentes áreas da empresa. E os custos passam a ser calculados de acordo com as necessidades e particularidades de cada setor dentro da estratégia da empresa – e não mais projetados de acordo com o ciclo orçamentário do ano anterior.
É uma boa sacudida para pôr a companhia nos eixos e prepará-la para voltar a crescer após o tempo de vacas magras.
Conheça alguns fundamentos de um programa de redução de custo.
DAR TRANSPARÊNCIA AOS GASTOS
A empresa precisa dar visibilidade aos seus custos. Saber o que está sendo gasto, por quem e onde. É indicado que a empresa agrupe os gastos em categorias – grupos de pacotes, como pessoal, telefonia, viagens, institucional, aluguel, marketing, energia elétrica, entre outros.
“Conhecendo os diferentes custos, o empreendedor pode criar um histórico e comparar diferentes áreas dentro da empresa e a sua situação em relação às práticas do mercado”, afirma Govier.
Nessa fase, é possível começar a identificar consumos desnecessários. Áreas improdutivas também podem ser detectadas.
DEFINIR RESPONSABILIDADES E METAS
Com os gastos visíveis, a empresa pode definir o que será necessário cortar. O especialista recomenda que a empresa eleja responsáveis de cada departamento para cuidar de cada pacote.
Por exemplo, o empreendedor pode destacar um funcionário de determinado setor para acompanhar os custos com as copiadoras do departamento. Outro colega pode ficar responsável pelos gastos com telefonia. Um terceiro deverá tomar conta do pacote viagens – custos com passagens áreas e hospedagem.
“Dar responsabilidade ao funcionário faz com que ele crie experiência no segmento e se especialize nas melhores soluções”, diz Govier.
Nessa fase também é o momento de definir as metas. Normalmente, empresas que não planejam o orçamento e precisam apertar o cinto criam reduções padronizadas – aquela velha frase “temos que cortar os custos em 10%”. Mas isso não é indicado.
O OBZ lida com as particularidades de cada departamento – ao mesmo tempo em que mantém a sinergia com o posicionamento geral da empresa. Por exemplo, cortar custo no setor de produção, que depende de fatores externos como preço da energia elétrica e manutenção de maquinário, tende a ser mais difícil do que em setores periféricos, como eventos institucionais.
As metas também não podem ser baseadas no passado. Mas sim no que a empresa precisa no presente. Celular corporativo é imprescindível para quais funções? Viajar em classe executiva faz sentido quando o trajeto é mais curto?
Ao mesmo tempo, adequar a atuação da empresa a novas metas nem sempre representa um sacrifício. Por exemplo, para reduzir significativamente o custo de viagens, a empresa pode adotar uma política de compra de passagens com no mínimo uma semana de antecedência – o que barateia muito o valor.
A renegociação de contratos também pode surtir efeito relevante. “Baseado no consumo esperado para o ano, a empresa pode concentrar as compras em dois ou três fornecedores”, afirma Govier. “Com mais volume e maior prazo de entrega, o fornecedor pode dar desconto.”
MUDAR COMPORTAMENTOS
Para atingir as metas é necessário engajar os funcionários. Primeiro, a empresa deve comunicar que pequenos gastos somados ao longo do tempo podem comprometer a empresa.
O empreendedor também deve explicar os motivos que levaram a enxugar os custos – retração econômica, dificuldades do setor, adequação do negócio a novas práticas do mercado. Explicar as razões de maneira transparente evita que um sentimento negativo perdure entre o pessoal.
Não é indicado que o programa adote um tom autoritário. Os gestores também precisar dar o exemplo. “A empresa não pode exigir comprometimento dos funcionários e permitir que os diretores fujam à regra”, afirma Govier.
Oferecer benefícios para os empregados e departamentos que atingem as metas ajuda no engajamento. A premiação pode ser uma remuneração variável atrelada a porcentagem de economia atingida.
Empresas com menos recursos podem oferecer desconto em seus próprios produtos ou brindes, como vale-presentes em outras lojas ou viagens. Também existem as honrarias morais, como troféus ou certificados dados aos colaboradores mais comprometidos com o programa.
A empresa também deve ser transparente ao comunicar os resultados do programa e qual o retorno que a economia proporcionou para o negócio. Se sobrar dinheiro em algum orçamento, ele deve ir para um caixa da empresa para ser alocado em áreas estratégicas, como treinamentos e pesquisa e desenvolvimento de novos produtos com potencial para aumentar a receita da empresa.
Ao mesmo tempo, a companhia mais eficiente tende a ter maior ganho líquido, o que gera impacto positivo em programa de participação de lucro – e agrada muito os funcionários.
COMO AGIR APÓS O ENXUGAMENTO
De acordo com os resultados alcançados pelos clientes da Accenture, no primeiro ano de implantação do OBZ, os custos gerais e administrativos caíram entre 10% e 25%. Os custos diretos de produtos e serviços recuaram de 5% a 10%.
No entanto, com o passar do tempo, a economia chega a um equilíbrio. “Em média, demora seis anos para atingir a estabilidade”, diz Govier.
Para buscar novas reduções, a empresa precisa reinvestir parte do dinheiro que economiza para gerar inovações disruptivas que afetem significativamente os custos e levem a empresa a outro patamar de eficiência.
A inovação pode consistir, por exemplo, na criação de um novo processo de produção ou de uma máquina que consuma menos energia, seja mais rápida, necessite de menos manutenção e que exija menor número de funcionários para ser operada.
“A partir daí, se inicia um novo ciclo de redução de custo”, afirma Govier. E a busca por eficiência não terá fim.